terça-feira, 5 de junho de 2012

Módulo 9 - Modernismo e Literatura

Fernando Pessoa poemas e análises

"Ela Canta, pobre ceifeira"


Ela canta, pobre ceifeira,
Julgando-se feliz talvez;
Canta, e ceifa, e a sua voz, cheia
De alegre e anónima viuvez,


Ondula como um canto de ave
No ar limpo como um limiar,
E há curvas no enredo suave
Do som que ela tem a cantar.


Ouvi-la alegra e entristece,
Na sua voz há o campo e a lida,
E canta como se tivesse
Mais razões p'ra cantar que a vida.


Ah, canta, canta sem razão!
O que em mim sente 'stá pensando.
Derrama o meu coração
A tua incerteza voz ondeando!


Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência
E a consciência disso! Ó céu!
Ó campo! Ó canção! A ciência


Pesa tanto e a vida é tão breve!
Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai! 




Análise do poema "Ela Canta, pobre ceifeira"


A ceifeira canta despreocupadamente, julgando-se "feliz talvez". A sua voz reflecte a vida simples do campo, a alegria e o anonimato dos que vivem em comunhão com a natureza.
Por isso, o seu canto é moderado, suave, "Ondula como um canto de ave" e reflecte-se no ar limpo.
O poema estrutura-se em duas partes lógicas. A primeira abrange as três estrofes iniciais, onde encontramos a apresentação da ceifeira, a descrição da melodia do seu canto e a referência às consequências que a audição da voz da ceifeira provoca em quem a ouve. O segundo momento da composição  poética corresponde às três ultimas quadras, marcadas por frases de tipo exclamativo, nas quais está patente a introspeção do sujeito poético, marcada por uma reflexão emocionada e pela consciência da efemeridade (brevidade, transitoriedade) da vida.
 

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